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terça-feira

A vocação que supera o sofrimento


"Maldito o dia em que nasci! Não seja bendito o dia em que me deu à luz minha mãe! Maldito o homem que deu as novas a meu pai, dizendo: Nasceu-te um filho!, alegrando-o com isso grandemente. (...) Por que não me matou Deus no ventre materno? Por que minha mãe não foi minha sepultura? Ou não permaneceu grávida perpetuamente? Por que saí do ventre materno tão-somente para ver trabalho e tristeza e para que se consumam de vergonha os meus dias?”
Jeremias 20.14-18.
Aqui o profeta demonstra passar por uma enorme crise que fora suscitada por sua vocação profética, que recebera de Deus antes mesmo de seu nascimento e que implicava numa vida de aparente insegurança e de forte tensão no confronto com Deus, o mundo, o pecado, as pessoas ao seu redor e consigo mesmo. Jeremias foi o mais perseguido e impopular profeta que a Bíblia apresenta, profetizou durante quarenta anos, pelo reinado de cinco reis e um governador de Judá, sendo em todo tempo desprezado, perseguido e castigado, mas sempre com uma inabalável fidelidade à vocação que recebera de Deus e que nos leva a seguinte pergunta: “Como este homem, que encontrava tantos problemas no seu ministério, pôde seguir até o fim este caminho, assumindo seu estado esmagador com uma obediência aparentemente sobre-humana?” (G. Von Rad).
Ao olharmos tanto para o Novo como para o Antigo Testamento encontramos várias pessoas, também de carne e osso, que como Jeremias passaram por desprezo e perseguição por causa da vocação que viviam em Deus e para a glória de Deus. Creio que a única explicação para a superação de tantas dificuldades por parte desses homens e mulheres do passado, esteja justamente na maneira que eles encaravam a caminhada com Deus, tendo em suas mentes e corações a certeza de uma jornada que não seria muito tranqüila, mas que estaria sempre acompanhada pela garantia de uma chegada totalmente segura.
O maravilhoso tanto em Jeremias como em outras pessoas que viveram ou vivem intensamente o chamado de Deus para suas vidas, é que mesmo em meio a tantas lutas, adversidades e crises, eles permanecem fiéis a vocação que de Deus um dia receberam, não aceitando retroceder e deparando sempre com a impossibilidade de fuga (Jonas) que em muitos momentos o coração frágil e enganoso os faz desejar.
O profeta demonstra bem tal impossibilidade, quando num momento de grande sofrimento e angústia, percebe que a única forma de não ser aquilo que Deus o vocacionou para ser antes mesmo de seu nascimento, seria não existindo. Por isso ele amaldiçoa o dia de seu nascimento, amaldiçoa aquele que trouxe as notícias de seu nascimento ao seu pai, lamenta toda tristeza, labuta, cansaço, humilhação que fazia parte de sua vida, que movida por uma força maior, foi, é e sempre será, a vida de um profeta de Deus em constante confronto com o mundo, a carne e o Diabo.
Era impossível para Jeremias, por maior que fosse o sofrimento a sua volta, não profetizar, pois ele era um profeta, ele existia, e antes dele, existia em Deus a vocação e o chamado que um dia recebeu para viver. Com isso aprendo e aceito, que por mais frágil que seja o profeta, não existe e nem jamais existirá sofrimento, adversidade ou crise, que seja capaz de matar uma vocação gerada pelo Pai na eternidade e por Ele sustentada nesta terra.
Nós cristãos precisamos nos lembrar mais das duras, porém muito explicativas e diretivas palavras de nosso Senhor Jesus àqueles que desejavam o seguir: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; quem perder a vida por minha causa, esse a salvará.” (Lc 9.23-24). Não podemos nunca nos esquecer que ser verdadeiramente vocacionado por Deus, sempre implicará em auto-negação, tomada de cruz e disposição radical para seguir o Mestre.

Deus abençoe sua vida!
No amor de Cristo,
Pr. Júnior Lima